terça-feira, 8 de março de 2016

Prefácio - por R.F. Lucchetti



FAZENDO AS VEZES DE PREFÁCIO
Rubens Francisco Lucchetti*


     Conheci Susy Ramone (pseudônimo de Susana Regina dos Santos de Lima) em outubro de 2014, quando criei minha página no Facebook. Ela foi uma de minhas primeiras amigas virtuais.
     No final de junho de 2015, recebi uma mensagem dela. A mensagem dizia o seguinte: Boa-noite, sr. Rubens. Como vai? Estou terminando um livro. É uma história de fantasmas. Tem como pano de fundo o incêndio do Edifício Joelma. O protagonista é um homem do interior; e o vilão, um falso pastor evangélico que apronta barbaridades para arrancar dinheiro dos fiéis. Bem, ainda estou revisando; mas gostaria de saber se o senhor aceitaria prefaciá-lo, se gostar da história.
     Aceitei, de imediato, o convite. E, poucos dias depois, recebi em minha casa um pacote com o original de O Edifício, o romance escrito pela Susy.
     Eu não canso de repetir: “Eu não sou um escritor. Sou um ficcionista.” Portanto, não sou um prefaciador. O Edifício é o segundo livro que prefacio (o primeiro foi A Dama-Morcega, da Giulia Moon). E tenho medo de que, como disse o quadrinhista norte-americano Harvey Kurtzman, ao prefaciar o livro Al Jaffee Funde a Cuca, “este prefácio precise de um prefácio”. Entretanto, não posso desapontar a Susy. Sobretudo porque, na carta que acompanhava o original ela, entre outras coisas, falava empolgada: “Fico muito honrada por ter a oportunidade de mostrar, em primeira mão, ao senhor o meu trabalho novo e aguardo ansiosamente pelas suas impressões. (...) Nada que eu diga conseguiria expressar a imensa alegria que sinto por ter aceitado o meu convite.
     Susy Ramone começou a escrever por volta de 2004-2005. Durante anos, teve um blog, onde postava diariamente contos de Horror/Terror. E, além de O Edifício, já escreveu outros três romances de Horror/Terror (segundo ela, escreve histórias desse gênero porque é o gênero de histórias que gosta de ler): Samyaza, O Castelo Montessales (epa! Que título!) e Poison Heart.
     O Edifício levou quase três anos para ser concluído.
     A história é narrada por Alice, uma mulher que se se apresenta logo nas primeiras páginas do livro e afirma que não é escritora e não conhece “as regras dos homens e mulheres das letras”. A ação se passa entre meados de 1973 e os primeiros dias de 1974, em plena ditadura militar, quando atrocidades eram cometidas em nome da segurança do país. Dois são os palcos dessa ação: a pequena cidade de Tatuí e São Paulo (capital). E dois também são os personagens principais: Waldemar, um sitiante de Tatuí; e Rogério Veiga, um homem cuja melhor habilidade é mentir e que tem como lema “os fins justificam os meios”, a máxima de Maquiavel.
     O Edifício narra o drama de Waldemar, um homem simples que, após perder o filho e depois a esposa, decide reconstruir sua vida em São Paulo e vai morar num dos mais importantes e emblemáticos edifícios da cidade, o Copan, projetado por Oscar Niemeyer. E em São Paulo, ele começa a ver fantasmas.
     Os fantasmas de O Edifício logo me fizeram lembrar de M. R. James, escritor inglês nascido em 1862 e falecido em 1936 e que se especializou em histórias de fantasmas (algumas dessas histórias eu li nos meados da década de 1940 na revista Contos Magazine).
     Como bem afirmou H. P. Lovecraft em seu célebre ensaio O Horror Sobrenatural na Literatura, M. R. James criou “um novo tipo de fantasma; (...) enquanto os velhos fantasmas típicos eram pálidos e percebidos principalmente pelo sentido da visão, o fantasma de James é geralmente franzino, pequeno e cabeludo – uma abominação noturna, lerda e diabólica, meio bicho e meio homem – e geralmente apalpado em vez de visto. E é neste ponto que os fantasmas de O Edifício têm algo em comum com aqueles criados por M. R. James: eles quase podem ser apalpados, quase podemos senti-los pelo sentido do tato, tal é a força com que Susy os descreveu. No entanto, são fantasmas que andam e podem ser vistos em plena luz do dia, não precisam da noite para aparecer e aterrorizar as pessoas.
     Devo confessar que O Edifício me surpreendeu. Tendo como pano de fundo uma história real e trágica (recordo-me perfeitamente daquela manhã lº de fevereiro de 1974, quando o Edifício Joelma incendiou-se; também me recordo dos assassinatos ali ocorridos em novembro de 1948), é um romance fantástico – com toques espirituais – muito bem construído.
     Bem, boa leitura... E proteja-se, porque os fantasmas estão à solta!

     Jardinópolis, 16 de novembro de 2015.


*Rubens Francisco Lucchetti, mais conhecido como R. F. Lucchetti, é ficcionista e roteirista de Cinema e Quadrinhos.

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